A última imagem que ficou da Copa América2024 foi bonita: Lionel Messi levantando mais uma grande taça para a Argentina, enquanto Ángel Di María celebrava sua aposentadoria “perfeita” pela seleção, ganhando o prêmio de man of the match da vitória por 1 a 0 sobre a Colômbia, no Hard Rock Stadium, em Miami.
No entanto, o torneio foi marcado por muitas reclamações de jogadores, técnicos e dirigentes contra a organização, pelos mais diversos motivos.
Para piorar, a grande final quase terminou em uma grande tragédia, por conta da enorme confusão na entrada de torcedores, que resultou em 27 prisões e 55 expulsos. e no adiamento do apito inicial em uma hora e vinte e dois minutos.
As falhas gritantes da Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol) e do Comitê Organizador norte-americano para lidarem com os problemas ainda ligaram um “sinal de alerta” para os próximos dois anos, já que os Estados Unidos vão receber mais duas grandes competições.
A primeira será o Mundial de Clubes 2025, que terá 32 equipes de todo o planeta e já tem entre seus participantes três brasileiros confirmados: Flamengo, Palmeiras e Fluminense.
Depois, acontecerá ainda o mais importante certame do mundo da bola: a Copa do Mundo2026, que será a primeira a contar com 48 seleções.
Vale lembrar, porém, que, ao contrário da Copa América, o Mundial de Clubes e a Copa do Mundo são organizadas pela Fifa, entidade que é conhecida por impor suas regras e vontades de maneira muito mais rígida, em todos os aspectos possíveis.
Abaixo, a ESPN relembra tudo o que deu errado na competição da Conmebol desde o início, com muita coisa tendo que ser resolvida nos próximos meses para que as coisas não terminem da mesma forma lamentável que nos ocorridos no Hard Rock Stadium no último domingo.
O tamanho dos campos
Dos 14 estádios utilizados na Copa América, apenas três não eram usados majoritariamente para jogos de futebol americano da NFL.
Com isso, a maior parte do torneio foi disputada em campos menores que os do “padrão Fifa” para o futebol, já que os gramados do esporte da bola oval têm medidas menores, mas ainda assim no limite permitido para prática de futebol.
O fato gerou reclamações de praticamente todos os que participaram da Copa América, como o lateral-direito Danilo, capitão da seleção brasileira, que apontou, antes da estreia contra a Costa Rica, que as partidas seriam muito mais feias e brigadas com menos espaço.
“Com essas dimensões, esperem muito combate, guerra, jogos de muito choque…”, alertou, em entrevista em 23 de junho.
Outra declaração fortíssima veio de Lionel Scaloni, treinador da Argentina. Logo após a conquista do título, ele “soltou os cachorros” na entrevista coletiva e pediu que, na Copa do Mundo 2026, as partidas sejam disputadas em “campos de futebol”.
“Dois metros a mais para cada lado é bastante, acredite… Espero que o Mundial (de 2026) seja jogado em campos de futebol, e não de futebol americano”, bradou.
A final da Copa América, aliás, foi disputada em um estádio de NFL: o Hard Rock Stadium, que é casa do Miami Dolphins.
Ao contrário do que quer Scaloni, todavia, a Copa-2026 terá vários estádios de futebol americano entre as sedes. Veja abaixo:
- MetLife Stadium (New York Giants/New York Jets)
- AT&T Stadium (Dallas Cowboys)
- GEHA Field at Arrowhead Stadium (Kansas City Chiefs)
- NRG Stadium (Houston Texans)
- Mercedes-Benz Stadium (Atlanta Falcons)
- SoFi Stadium (Los Angeles Rams/Los Angeles Chargers)
- Lincoln Financial Field (Philadelphia Eagles)
- Lumen Field (Seattle Seahawks)
- Levi’s Stadium (San Francisco 49ers)
- Gillette Stadium (New England Patriots)
- Hard Rock Stadium (Miami Dolphins)
Várias dessas arenas, porém, também recebem jogos de futebol dos clubes da MLS, mesmo com dimensões menores do que o “padrão Fifa”.
O Allegiant Stadium, casa do Las Vegas Raiders, por sua vez, não será uma das sedes do próximo Mundial, apesar de ter sido usado na Copa América.
Já no México e no Canadá, todos os estádios tem como atividade principal o futebol, e não o futebol americano.
Para o Mundial de Clubes 2025, as sedes ainda não foram definidas pela Fifa.
A expectativa, porém, é que o torneio seja realizado na costa leste dos Estados Unidos, já que na costa oeste estará sendo jogada a Copa Ouro da Concacaf.
Além disso, os horários do leste norte-americano também são muito mais favoráveis para os telespectadores da Europa, que é o continente com o maior número de participantes no torneio: 12.
A qualidade dos gramados
Além de “apertados”, os gramados da Copa América também foram detonados por sua qualidade.
Em vários casos, estádios que usam campo sintético trocaram seus tapetes por grama natural às vésperas do início da competição da Conmebol.
Muitos deles, porém, desagradaram os jogadores, como o do Mercedez-Benz Stadium, em Atlanta.
Uma das piores críticas de toda a competição foi feita pelo goleiro Dibu Martínez, da Argentina, após a vitória sobre o Canadá na estreia da competição.
“O campo era um desastre e nos complicou bastante. A bola ia correndo e pulando… O Di María teve um lance que saiu cara-a-cara e teve que chutar de direita porque não conseguia dominar a bola, que só quicava. Temos que melhorar isso ou a Copa América sempre vai ser um nível abaixo da Eurocopa”, disparou.
Apenas 24 horas depois, o treinador do Peru, Jorge Fossati, culpou o campo do AT&TStadium, em Arlington (Texas), pela lesão do lateral Luis Advíncula no jogo contra o Chile.
Néstor Lorenzo, comandante da Colômbia, também se revoltou com a grama do NRGStadium, em Houston (Texas), palco do jogo contra o Paraguai
Várias outras arenas ainda tiveram reclamações, como o MetLife Stadium, o Levi’s Stadium e o SoFi Stadium.
As temperaturas
Não é segredo para ninguém que o verão dos Estados Unidos é marcado por temperaturas altíssimas. E isso foi visto durante a Copa América.
Em praticamente todas as cidades-sede, o calor foi infernal, com destaque para Las Vegas, onde a seleção brasileira atuou duas vezes e encarou temperaturas que chegaram a ter máximas de 49ºC.
Locais como East Rutherford (do lado de Nova York), Santa Clara e Glendale (na região metropolitana de Phoenix) também registraram termômetros “explodindo”, o que fez até o costumeiramente calado Lionel Messi reclamar publicamente.
“A verdade é que foi uma Copa (América) difícil… Campos bem ruins, a temperatura muito alta, foi difícil de jogar”, ressaltou.
Houve ainda enormes “choques térmicos”, causados pelo fato de algumas arenas, como o Allegiant Stadium, em Las Vegas, serem climatizadas e até frias no interior, enquanto o exterior estava escaldante. Treinadores e jogadores criticaram esse aspecto, dizendo que piora a recuperação e ajuda a causas doenças.
A situação na grande final foi uma das piores em toda a competição, com quase 40ºC de temperatura em Miami e umidade altíssima, o que transformou o Hard Rock Stadium praticamente numa “sauna” antes, durante e depois do jogo.
O calor também contribuiu muito para que várias pessoas desmaiassem e precisassem de atendimento médico na confusão ocorrida antes de Argentina x Colômbia.
Vale lembrar que o Mundial de Clubes 2025 e a Copa do Mundo 2026 também serão jogadas no verão dos Estados Unidos. Portanto, os torcedores já sabem o que esperar…
A “guerra” Brasil x Conmebol por logística
Brasil e Conmebol não se olharam “olho-no-olho” desde o início da Copa América.
Como mostrou a ESPN em primeira mão, a relação começou a ficar ruim com as reclamações de jogadores como Vinicius Jr. e Danilo contra os gramados “apertados”, e “azedou” de vez na chegada da equipe canarinho a Las Vegas, após o empate por 0 a 0 com a Costa Rica na estreia.
De acordo com diversas fontes ouvidas pela reportagem, o Brasil desaprovou totalmente a escolha do CT designado pela Conmebol para o time de Dorival Júnior treinar em Vegas: o Bettye Wilson Soccer Complex, um parque público em uma área longe da “Las Vegas turística” mundialmente conhecida.
A seleção considerou que a estrutura do local era muito aquém do esperado para uma competição do porta da Copa América, além de ser extremamente distante do hotel em que a delegação ficou hospedada, na região de Lake Las Vegas.
Causou incômodo também o fato do Bettye Wilson Soccer Complex ser pouco “protegido” de olhares alheios. Durante os treinos, os atletas ficaram expostos a gritos de torcedores, que subiram em um viaduto próximo ao campo de treinamento e soltaram a voz até serem (claramente) ouvidos.
Depois disso, ainda ocorreu o episódio do problema no avião reservado pela Conmebol para transportar a seleção brasileira de Las Vegas até San Jose, local do 3º jogo do grupo D da competição, contra a Colômbia.
Na ocasião, o Brasil teve que esperar a troca da aeronave e atrasou bastante seu deslocamento até a Califórnia, com os atletas chegando no início da madrugada ao hotel em San Jose.
Os muitos problemas na “cidade dos cassinos” fizeram até o a CBF solicitar a troca do hotel na 2ª passagem por Las Vegas, para a disputa das quartas de final contra o Uruguai.
A seleção até conseguiu o que queria, mas viveu um novo estresse na chegada ao hotel Renaissence, em 4 de julho, com os atletas sendo obrigados a ingressar pela porta dos fundos do estabelecimento.
“Nós não somos bandidos para entrar por aqui”, reclamou o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, na ocasião.
Os intervalos rígidos e as suspensões
Outro fator que desagradou, e muito, os técnicos e atletas durante a Copa América foram os rígidos períodos de intervalo estabelecidos pela Conmebol.
Em casos de atrasos para retorno ao gramado após os 15 minutos, foram aplicadas multas de US$ 15 mil (R$ 81,72 mil) e ainda a suspensão dos treinadores das equipes que demoraram.
Ao todo, quatro comandantes levaram gancho de um jogo por causa disso: Lionel Scaloni (Argentina), Marcelo Bielsa (Uruguai), Ricardo Gareca (Chile) e Fernando Batista (Venezuela).
Posteriormente, a medida foi duramente criticada pelos técnicos que foram punidos e também pelos que não foram.
Jogadores como o volante Bruno Guimarães, do Brasil, não ficaram em cima do muro e reforçaram o tom contra a Conmebol.
“A gente tem que ficar olhando o cronômetro (do vestiário) para não deixar passar (a hora de retornar a campo), apesar de eu achar que a Conmebol tem coisa mais importante para se preocupar do que isso…”, afirmou.
“A gente sabe o que isso [atraso] pode acarretar e não queremos perder nosso treinador, que é um cara muito importante para gente. Não queremos passar o tempo, então, quando está com 11, 12 minutos (de intervalo), a gente já tem que sair correndo para o campo, porque não queremos perder ninguém nesse caminho até a decisão”, complementou.
A rigidez da Confederação Sul-Americana acabou gerando um fato irônico na final, que teve o show da cantora colombiana Shakira no intervalo.
Devido à apresentação, a pausa entre o primeiro e o segundo tempo durou 25 minutos, e não 15. Com isso, a partida, que já teve seu início atrasado em quase uma hora e meia devido às confusões prévias, demorou ainda mais para acabar…
O VAR
O VAR mais uma vez voltou a ser notícia de maneira negativa em uma competição da Conmebol.
Durante a Copa América, o sistema de vídeo teve atuação para lá de confusa, sendo duramente criticado por atletas e treinadores.
Em Estados Unidos x Uruguai, por exemplo, os norte-americanos reclamaram muito das linhas traçadas na checagem de impedimento do gol uruguaio, que foi validado de forma extremamente polêmica.
Já em Brasil x Colômbia, os cafeteros também se revoltaram com anulação de gol de cabeça de Davinson Sánchez, após uma checagem “infinita” e que terminou com uma imagem bizarra da linha do VAR sendo traçada de frente devido à falta de opções de câmeras.
Pior ainda foi o pênalti claríssimo não dado em cima do atacante Vinicius Jr. no próprio Brasil x Colômbia, no final do 1º tempo. O erro foi tão evidente que a própria Conmebol divulgou análise admitindo que a infração deveria ter sido marcada pelo juiz após recomendação dos árbitros de vídeo.
Dentro dos estádios, os torcedores também ficaram confusos com a falta de explicações no serviço de som e nos telões, já que quase nunca era explicado o que estava sendo analisado pelo VAR – também não eram mostrados replays ou as linhas de impedimento sendo traçadas em tempo real.
Já na hora que o árbitro usava seu microfone para explicar a decisão tomada no lance, muitas vezes era impossível entender o que o juiz estava dizendo, deixando as pessoas presentes na arquibancada ainda mais perplexas.
Resta agora saber se a Fifa irá usar o moderno sistema de impedimento semiautomático no Mundial de Clubes 2025 e na Copa do Mundo 2026 ou se apostará nas linhas “manuais” feitas nos torneios da Conmebol…
Briga entre torcedores e… Jogadores!
A semifinal entre Colômbia e Uruguai foi marcada por cenas assustadoras e surreais no Bank of America Stadium, em Charlotte.
Logo após o apito final, atletas da seleção celeste, como o atacante Darwin Núñez, subiram nas arquibancadas e começaram a brigar com torcedores, chegando inclusive a trocar socos.
As cenas lamentáveis rodaram o mundo, sujando ainda mais a já manchada imagem da Copa América 2024.
O caso foi tão grave que até mesmo o Liverpool, clube de Darwin, iniciou uma apuração própria para entender o que aconteceu no tumulto.
A Conmebol reagiu com uma nota oficial condenando o ocorrido na semi e prometendo que a grande final da competição teria “tolerância zero” contra a violência.
As cenas prévias à decisão entre Argentina e Colômbia, porém, foram ainda mais feias…
O caos da final
A última partida da Copa América foi marcada por um caos simplesmente assustador em todos os aspectos.
A chegada dos torcedores ao Hard Rock Stadium, que fica em uma região chamada Miami Gardens, bastante afastada do centro de Miami, já foi por si só maluca, já que o trânsito começou a ficar infernal muitas horas antes da partida.
Nas horas prévias ao jogo, todavia, a situação escalonou ainda mais nos arredores da arena, com um primeiro tumulto gerado por fãs que tentavam entrar sem ingresso forçar o fechamento dos portões de acesso. A ESPN também testemunhou tentativas de roubo de credenciais de imprensa.
Após 40 minutos de espera e a chegada de reforço policial, a situação se acalmou um pouco e as portas foram reabertas. No entanto, mais torcedores sem bilhetes forçaram a invasão por todos os lugares possíveis, chegando a pular os muros do estádio e subir por dutos de ventilação até as arquibancadas.
Isso fez com que o início da final fosse adiado em 30 minutos. Mas como as autoridades demoraram muito para controlar o caos, a partida só foi começar com uma hora e 22 minutos de atraso – e com milhares de torcedores sem ingresso assistindo de lugares proibidos, como escadas e balcões de transmissão de TV.
Os corredores do estádio, por sua vez, ficaram manchados de sangue, fruto da ação da polícia para tentar deter os invasores.
Os próprios jogadores viveram situação dramática, com muitos saindo do vestiário para “resgatar” familiares que não estavam conseguindo entrar no Hard Rock Stadium.
Na coletiva pós-jogo, o treinador da Colômbia, Néstor Lorenzo, disse que o drama afetou muito seus atletas.
“Nós estávamos no vestiário já aquecendo e nos avisaram que iria atrasar meia hora. Creio que demorou uma hora, certo? Uma hora e quinze, um pouco mais… Imagine só! Estávamos tentando nos comunicar com familiares e amigos, ver se estavam com problemas ou não. Isso atrapalhou um pouco tudo. Foi caótico”, apontou.
O treinador da Argentina, Lionel Scaloni, também falou sobre o tema e salientou que os atletas da Albiceleste também ficaram muito estressados com tudo o que ocorreu.
“É difícil de explicar e entender… Os jogadores ficaram uma hora fora do estádio esperando que viessem seus familiares. Tivemos que entrar para jogar a partida assim”, disparou.
“Todos ficaram mandando mensagens para a família, muitos não respondiam… Vimos os vídeos circulando, não estávamos alheios. Tivemos que entrar em campo assim”, lamentou.
“Creio que os jogadores da Colômbia também estavam numa situação parecida. Foi algo muito estranho e esquisito”, finalizou.
Para o Mundial de Clubes 2025 e a Copa do Mundo 2026, uma coisa é certa: o episódio do Hard Rock Stadium tem que servir de lição para que tudo seja feito de forma diferente.
fonte: site ESPN grupo Disney